Sou bisbilhoteira ou observadora? Na opinião do meu marido sou bisbilhoteira, porque quando viajo ou comemos fora, estou permanentemente a reparar nos outros; para alguns dos meus amigos, sou observadora.Por mim, penso que sou curiosa.
Sucede que nos vinte minutos que viajo entre Paço de Arcos e Cais do Sodré, no Metro, quando me detenho num local publico (e não há lugar melhor para observar os nossos semelhantes, que um transporte, seja ele urbano ou de longo curso, um restaurante, ou uma paragem de autocarro ) tenho muito tempo para reparar nos que me rodeiam.
Aprendi com isso,que a Vida, na sua generalidade, não apresenta espectos muito diferentes dumas pessoas para as outras.Todos temos aborrecimentos e alegrias, esperança e desespero.Falamos dos filhos, dos netos, da saúde,do preço das coisas, dos patrões, dos empregados e todos gostamos um pouco de fofocas. É assim que, por vezes, venho a conhecer pessoas que têm uma história especial, e em quem, os apressados e indiferentes, nem reparam.
E porque eu reparo, aquela rapariga, parada numa estação do Metro, olhando para todos os lados, suscitou o meu interesse pela sua semelhança com um pássaro assustado; um pássaro do campo que inesperadamente se encontrasse no meio da cidade. Quando lhe perguntei se precisava de ajuda, pareceu-me que um peso tinha saído dos seus ombros, porque até sorriu. Como queria ir para Cascais disse-lhe que viesse comigo, pois, por ser domingo, o nosso comboio era o mesmo. Comprávamos o bilhete ,quando o comboio partiu e tivemos que esperar a meia hora habitual.
Enquanto contava a sua história, pareceu-me estar a ver um filme, daqueles que começam pelo fim.
Era uma história banal, de mulheres que apanham pancada, vão inúmeras vezes ao hospital, dizendo que caíram pelas escadas, de braços partidos, de cabeças rachadas, de insultos, O que me espantava, era a sua maneira tranquila de contar. Ao fim de 22 anos de pancada (nem menos um ano, minha senhora) fartara-se e depois da última tareia de cinto que levara, no dia seguinte deixara-o ir para o trabalho e fora-se embora para o Abrigo, de que uma vizinha lhe falara. Não levara nada, só a roupa, nem queria nada do marido. Não apresentara queixa na polícia como as Senhoras do Abrigo lhe tinham aconselhado.Fazia 38 anos no próximo dia 19 e só queria viver sossegada. Se ele quisesse o divórcio, que se divorciasse, embora as Senhoras lhe tivessem explicado que não teria direito a nada pois fora ela quem abandonara a casa e não apresentara queixa à policia de maus tratos.Mas nada, fora o que ela tivera sempre. E agora, ia a caminho de Cascais, para ser interna em casa dum casal da Quinta da Marinha, emprego que as Senhoras tinham arranjado. Tivera que ser, porque a lida da casa e costurar era a única coisa sabia fazer Mas os Senhores pareceram-lhe boas pessoas, tinham duas meninas, quatro cães, um lindo jardim com muitas arvores e flores. E ela sempre gostara de crianças, de cães de árvores e de flores.Podia ser piorQueria era viver com sossego.
Que se diz a uma mulher que conta uma história destas? Como disse, é uma história vulgar, mas eu nunca tinha ouvido tais factos narrados pela protagonista do drama. Limitei-me a dizer-lhe, quase com vergonha da banalidade das palavras, que depois de tudo quanto passara, nada poderia ser pior e que decerto a partir de agora iria viver mais sossegada. Quando estávamos em Algés, pediu-me licença para me dar o número do seu telemóvel. Eu tinha-lhefeito tanto bem, que se precisasse de alguma coisa, bastava telefonar-lhe.
Nem por um instante pensei que estivesse a divertir-se à minha custa, porque compreendi que era a sua maneira de agradecer-me te-la deixado falar sem a interromper. Desabafar com uma desconhecida, que provavelmente não tornaria a ver, fora o que ela mais precisara no momento.
Se o meu marido lesse isto, diria que a sua opinião se confirmava. Lá estivera eu a bisbilhotar a vida das pessoas!
Não tens razão, meu Velho. Se eu não tenho escutado a Fátima,não teria o numero do seu telemóvel, não poderia ter-lhe telefonado hoje, dia em que completa o seu 38ª aniversário, não saberia que os Senhores são muito bons, as meninas muito bem educadas, os cães são uns amores, a senhora está muito contente porque ela salvou uma avenca que estava a morrer e quando vai passar os fins de semana ao Abrigo, as Senhoras estão muito contentes com ela
Não teria sabido que o seu pequeno mundo parece viver no sossego que ela tanto deseja.
Sucede que nos vinte minutos que viajo entre Paço de Arcos e Cais do Sodré, no Metro, quando me detenho num local publico (e não há lugar melhor para observar os nossos semelhantes, que um transporte, seja ele urbano ou de longo curso, um restaurante, ou uma paragem de autocarro ) tenho muito tempo para reparar nos que me rodeiam.
Aprendi com isso,que a Vida, na sua generalidade, não apresenta espectos muito diferentes dumas pessoas para as outras.Todos temos aborrecimentos e alegrias, esperança e desespero.Falamos dos filhos, dos netos, da saúde,do preço das coisas, dos patrões, dos empregados e todos gostamos um pouco de fofocas. É assim que, por vezes, venho a conhecer pessoas que têm uma história especial, e em quem, os apressados e indiferentes, nem reparam.
E porque eu reparo, aquela rapariga, parada numa estação do Metro, olhando para todos os lados, suscitou o meu interesse pela sua semelhança com um pássaro assustado; um pássaro do campo que inesperadamente se encontrasse no meio da cidade. Quando lhe perguntei se precisava de ajuda, pareceu-me que um peso tinha saído dos seus ombros, porque até sorriu. Como queria ir para Cascais disse-lhe que viesse comigo, pois, por ser domingo, o nosso comboio era o mesmo. Comprávamos o bilhete ,quando o comboio partiu e tivemos que esperar a meia hora habitual.
Enquanto contava a sua história, pareceu-me estar a ver um filme, daqueles que começam pelo fim.
Era uma história banal, de mulheres que apanham pancada, vão inúmeras vezes ao hospital, dizendo que caíram pelas escadas, de braços partidos, de cabeças rachadas, de insultos, O que me espantava, era a sua maneira tranquila de contar. Ao fim de 22 anos de pancada (nem menos um ano, minha senhora) fartara-se e depois da última tareia de cinto que levara, no dia seguinte deixara-o ir para o trabalho e fora-se embora para o Abrigo, de que uma vizinha lhe falara. Não levara nada, só a roupa, nem queria nada do marido. Não apresentara queixa na polícia como as Senhoras do Abrigo lhe tinham aconselhado.Fazia 38 anos no próximo dia 19 e só queria viver sossegada. Se ele quisesse o divórcio, que se divorciasse, embora as Senhoras lhe tivessem explicado que não teria direito a nada pois fora ela quem abandonara a casa e não apresentara queixa à policia de maus tratos.Mas nada, fora o que ela tivera sempre. E agora, ia a caminho de Cascais, para ser interna em casa dum casal da Quinta da Marinha, emprego que as Senhoras tinham arranjado. Tivera que ser, porque a lida da casa e costurar era a única coisa sabia fazer Mas os Senhores pareceram-lhe boas pessoas, tinham duas meninas, quatro cães, um lindo jardim com muitas arvores e flores. E ela sempre gostara de crianças, de cães de árvores e de flores.Podia ser piorQueria era viver com sossego.
Que se diz a uma mulher que conta uma história destas? Como disse, é uma história vulgar, mas eu nunca tinha ouvido tais factos narrados pela protagonista do drama. Limitei-me a dizer-lhe, quase com vergonha da banalidade das palavras, que depois de tudo quanto passara, nada poderia ser pior e que decerto a partir de agora iria viver mais sossegada. Quando estávamos em Algés, pediu-me licença para me dar o número do seu telemóvel. Eu tinha-lhefeito tanto bem, que se precisasse de alguma coisa, bastava telefonar-lhe.
Nem por um instante pensei que estivesse a divertir-se à minha custa, porque compreendi que era a sua maneira de agradecer-me te-la deixado falar sem a interromper. Desabafar com uma desconhecida, que provavelmente não tornaria a ver, fora o que ela mais precisara no momento.
Se o meu marido lesse isto, diria que a sua opinião se confirmava. Lá estivera eu a bisbilhotar a vida das pessoas!
Não tens razão, meu Velho. Se eu não tenho escutado a Fátima,não teria o numero do seu telemóvel, não poderia ter-lhe telefonado hoje, dia em que completa o seu 38ª aniversário, não saberia que os Senhores são muito bons, as meninas muito bem educadas, os cães são uns amores, a senhora está muito contente porque ela salvou uma avenca que estava a morrer e quando vai passar os fins de semana ao Abrigo, as Senhoras estão muito contentes com ela
Não teria sabido que o seu pequeno mundo parece viver no sossego que ela tanto deseja.
Parabens fisest uma pessoa feliz
ResponderEliminar