A PRIMAVERA

Se fosse possível viver cem anos, cem vezes sentiria este deslumbramento interior que é a chegada da Primavera e do Outono. O verão e o Inverno considero-os como conhecidos a quem se tolera mas sem qualquer afeição ou desejo que cheguem.
A Primavera que eu sinto, não é só reconhecível por flores e passarinhos. Nunca me comovi com a chegada das andorinhas, animaizinhos diligentes mas bastante porcos, nem com o desabrochar das flores. São os cheiros, a tepidez do ar, o vasto leque de cores que tanto a Primavera como o Outono oferecem aos meus olhos que me encantam.
Começo a aperceber-me que primavera vai chegar, pelo ar morno que uma certa manhã chega através da minha janela. Vou à varanda e as flores estão todas arrebitadas porque sabem que a partir dali tudo lhes será favorável. Acabaram os grandes frios, as noites começarão a ficar suaves e mesmo que eu me esqueça de regá-las um dia, nada acontecerá de grave. A caminho do Paredão, no velho jardim de Paço de Arcos, os relvados parecem mantas incas tal a variedade de tons, maior parte deles escolhidos pela natureza e matizados pelo jardineiro com primor.
Tenho os mesmos sentimentos no Outono, mas no sentido inverso. É o ar, que pela manhã já surge fresquinho, fazendo desaparecer o calor do verão, que detesto (o calor, porque o verão, enfim, já que tem que ser...) São as folhas das árvores,que,no Gerês, é um espectáculo pelo qual vale a pena viajar até lá. Nunca vi tal combinação de tons de ouro e fogo, que vai do amarelo limão, até ao castanho muito escuro da boa terra, passando pelos vários tons que o fogo por vezes toma; tudo isto pincelado por misturas de verdes secos.
Chegou a Primavera neste ano de 2010. Por enquanto ainda sorrateira, sem vangloriar-se do seu encanto, mas dizendo-nos que não devemos desesperar,perante as coisas desagradáveis que a Vida por vezes nos traz.

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